REMAR, PEDALAR, CAMINHAR... AVENTURAR-SE
Expressão de espanto é a coisa mais comum quando algum amigo descobre que já fiz viagens de seis dias em meu barco a remo. “Não seria mais fácil um barco a motor?”, perguntam eles.
Certa
vez, em setembro de 2004, acampamos às margens do lago Serra da Mesa por oito
dias. Chegamos ali numa quarta-feira. Imperava o silêncio. Todo aquele lago era
só nosso. Barracas armadas na margem, canoa canadense na água e ao longe as
luzes da mineradora Codemin.
No sábado fomos acordados por barulhos de motores náuticos. O lago ficou tão movimentado que até parecia um ‘pier’. Saímos para remar e por todo lado víamos barcos movidos por potentes e barulhentos motores, pessoas curtindo a vida como bem sabiam: pescando, estendendo-se ao sol, tomando banho, garotos correndo de um lado para o outro em seus jet-skis. Um olhar atento me levantou uma dúvida: estariam eles realmente aproveitando a beleza natural do local, perdidos no meio de todo aquele conforto e laser?
Atracado em uma
árvore semi-submersa no lago Serra da Mesa
Enquanto isso, nós remávamos de um lado para o outro, extasiados com a beleza das árvores submersas, pequenas ilhotas, assombrados com a própria graça de, com tão pouco, desfrutar do mesmo lugar, até mais do que aquela gente em seus barcos velozes.
Pois
a canoa entrava em partes rasas e cheias de galhos onde os barcos não poderiam
chegar. E é claro, por não podermos navegar tão rápido, gastávamos mais tempo
apreciando o lugar, percebíamos coisas que escapariam ao olhar apressado, nos
detínhamos em detalhes que desabrochavam sem pressa. E escutávamos o vento,
sentíamos a superfície arrepiada da água – coisas que ao pessoal dos barcos eram
negadas. Sem mencionar a prazerosa sensação de pôr os braços e fôlego a
trabalhar, a saudável alegria de star fazendo força para descobrir aquilo tudo.
No topo da Serra da
Areia, Aparecida de Goiânia
A vida tem muito mais disso: MAIS não é necessariamente MELHOR. E a aventura é uma das formas de nos pormos em contato com o melhor que a Terra possa nos oferecer, e com o que temos de melhor dentro de nós mesmos. Fala-se muito na necessidade de se encontrar, de escapar à confusão e ao frenesi da vida moderna. Mas em nenhum outro momento conseguimos encontrar tão completa satisfação, como quando estamos explorando a pé uma trilha por dentro da mata, descendo de bike um novo caminho, ou de alguma forma comungando com uma serra, um rio, ou os ritmos do planeta. Conforto não faz necessariamente parte desta equação. Pois há alguma coisa primitiva e irresistível na simplicidade animal de apenas partir de um ponto do mapa e chegar até o outro, usando pernas, braços – e os olhos. Como sal numa receita insossa, a aventura acrescenta um sabor à própria vida. Só é preciso saber onde procurá-la.
Caminhada nas "ruínas" da antiga cidade de Traíras
Mas o que é aventura? Um lugar? Um momento? Estado de espírito? Sabemos reconhecê-la quando a encontramos, mas não conseguimos defini-la. O que é aventura para uns, para outros é mero turismo selvagem. O que para estes é aventura, para aqueles pode significar apenas excessivo risco ou rematada loucura. Cada um acaba então tendo que buscar seu próprio nível de “aventura”. Mas o denominador comum é que a coisa tem que ser uma busca, uma procura pessoal, um encontro – com o novo, com o inesperado, com o surpreendente. E para isto, é preciso estar pronto a enfrentar – frio, chuva, desconforto, sol. Até mesmos seus medos! Um pouco de desconforto e de perigo fazem maravilhas pela sua alma.
Não
é algo que os outros possam planejar por você.
Erosão em formação na Serra da Areia
Não é algo que possam lhe oferecer, como um produto ou um serviço. É mais do que um passeio no bosque. Pois implica em certo grau de incerteza, em certa dose de coragem. A aventura exige que você se lance premeditadamente e tome suas próprias decisões. Mas as recompensas, por outro lado, são enormes. Vá nessa!
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