RIO
MEIA PONTE
DE
GOIATUBA A PANAMÁ
Ernesto Renovato e
Paulo Castilho
Manhã de um dia de
feriado, tínhamos a intenção de partir bem cedo para chegar a cidade de
Goiatuba e ter tempo para descermos o rio, mas enrolamos um pouco,
principalmente porque precisávamos comprar uma lona para colocar sobre as
barracas devido ao período chuvoso. Infelizmente o amigo Ernesto tem o
hábito de sempre sair tarde para as nossas aventuras. Pra se ter uma ideia, o
horário marcado para a saída era 8 da manhã e já passava da 9:30 quando ele
decidiu comprar a lona.
Como estávamos
divididos em dois grupos, resolvi seguir com o meu (Paulo, Hugo e Renato) na
frente, com o combinado de nos encontrarmos na rodovia, uma vez que o Ernesto
tem o pé bem "pesado". Renato, que estava dirigindo, precisava chegar
em Goiânia o mais rápido possível, já que ele entraria no serviço às 14 horas.
Ernesto e Paulo
Castilho
Chegamos no trevo
de Goiatuba por volta do meio-dia. Até o rio nós teríamos mais umas duas horas
(ida e volta)... não daria tempo do Renato voltar à Goiânia. Decidi que
ficaríamos ali mesmo, no trevo, por onde o Ernesto obrigatoriamente teria que
passar. Com todo o equipamento descarregado na beira da estrada, Renato pegou o
caminho de volta.
Pra se ter uma ideia
da demora no meu companheiro, o Ernesto, ficamos por ali mais uns 30 minutos.
Quando ele chegou, expliquei a situação. Ele teria que dar duas viagens até o
rio para levar a equipe. Fui na primeira leva, para preparar o equipamento
(carregar os caiaques com as bagagens). A distância de ida e volta era
de aproximadamente 35 Km para cada viagem, o que atrasou ainda mais nossa
partida.
Após nossa
chegada, o Ernesto foi até a ponte da rodovia para tirar umas fotos já que na
nossa última chegada na expedição anterior ele não havia registrado fotos do
local. Após as fotos resolveu voltar para carregar coisas para as margens e
preparar os caiaques. Ele não contava apenas com um detalhe que prejudicou o
registro de todo nosso passeio, havia colocado a maquina fotográfica no bolso e
foi descer um barranco de um pequeno riacho para chegar ao outro lado, o
problema é que escorregou e algumas coisas que estavam com ele caíram dentro do
riacho que estava com a água barrenta, acabava ali a possibilidade de fazer muitos
registros de nossa nova aventura.
Ernesto e sua
esposa (na época ainda noivos)
Já era mais ou
menos uma da tarde, tinha início mais uma descida. Dessa vez continuamos a
partir do nosso último ponto de parada que foi na ponte que liga Goiatuba a
municípios como Aloândia. O Meia Ponte estava bem cheio devido às chuvas na
cabeceira do rio, nos municípios mais acima. Nosso amigo Leonardo estava com a
namorada, Cristiane, e ambos desceriam em um bote que já imaginávamos que não
seria rápido para acompanhar os caiaques.
O inicio da
descida foi bem tranquilo, apesar do sol que estava bem quente, tínhamos em
mente que remaríamos em torno de 45 Km para chegarmos a uma área para
acamparmos, que escolhemos através da imagem do satélite. Nossa suspeita a
respeito da velocidade do bote que nos acompanhava se tornou real, o bote era
difícil de controlar, não se mantinha em linha reta e estava desgastando a
dupla que estava nele, além do mais o nosso amigo Leonardo de vez em quando
tentava pescar no rio, ou seja, diminuía ainda mais o ritmo da turma.
Conseguíamos acompanhar a velocidade de descida através do GPS e percebíamos
que não estava nada boa. Para adiantar um pouco a velocidade para tentarmos
chegar ao ponto escolhido, amarramos uma corda no bote e no caiaque onde o
Ernesto estava. Apesar de ficar um pouco mais pesado, a velocidade média do conjunto
ficou maior, ficamos então com a esperança de que chegaríamos a tempo. Ledo
engano, não dava tempo e tivemos que pensar em um novo ponto para acampamento,
afinal de contas já estava ficando escuro, e o tempo estava fechando por causa
da chuva, era essencial podermos montarmos acampamento com o tempo claro.
"Área de
camping natural" no meio do nada.
Após passarmos por
uma ilha onde havia um rancho, encontramos um lugar que parecia um recanto, com
uma área gramada e limpa em meio a grandes árvores. O lugar era ótimo, o
problema é que a dupla do bote quase passou do lugar, o que abortaria a parada
naquele ponto. Passado o susto da parada, começamos a descarregar as coisas, o
problema era só a subida no local, que era meio escorregadio e havia barro.
Fomos então colocando as coisas e por fim, subimos todos os caiaques e o bote.
Depois de nos ambientarmos ao local, o que foi muito rápido, começamos a armar
o acampamento, colocamos as lonas por cima das barracas. Eu preferi minha
barraca um pouco mais longe, cobrindo-a com minha própria lona.
Ainda bem que
trouxemos a lona, pois, assim que montamos acampamento começaram a cair alguns
pingo que perduraram por toda a noite. Enquanto o resto da equipe montava suas
barracas, sai à procura de lenha, aproveitado para fazer um reconhecimento da
região. Recolhi alguma madeiras (a maioria úmida devido ao clima e algumas
palhas secas de uma lavoura próxima, que me serviram de travesseiro e ajudaram
para acender a fogueira que fizemos. A comida nós preparamos num fogão de
álcool, geralmente macarrão instantâneo ou sopa. Em relação a banho, somente o
Ernesto a Érica que tomaram. A alegação é de que ele não consegue dormir sem
tomar banho (coisa de escoteiro).
Minha barraca e
sua varanda, improvisada com o auxílio de dois remos
Interessante foi
ver a quantidade de peixes que existe no rio a noite, quando o Ernesto colocava
a lanterna perto da água via a quantidade, só nas proximidades haviam milhares,
a água mexia sem parar devido a quantidade de de peixes que existe no rio a
noite, quando o Ernesto colocava a lanterna perto da água via a quantidade, só
nas proximidades haviam milhares, a água mexia sem parar devido a quantidade de
alevinos. Após o banho cada qual entrou para sua respectiva barraca,
ainda era bem cedo, mas como não havia nada pra fazer, a opção era dormir. A
chuva então começou, no inicio foi bem tímida, mas, pra falar a verdade, o
Ernesto não queria chuva tímida, queria que chovesse muito. Claro que depois
ele ficou um pouco apreensivo, afinal de contas, será que a lona por cima da
barraca iria funcionar? Funcionou, ainda bem.
Situação do
acampamento
Mais uma noite se
passou, acordamos bem cedo, a expedição iria continuar. Antes de mais nada
procuramos saber se o rio havia subido, subiu sim, mas muito pouco, ele estava
cheio, mas era por causa de chuvas que caiam muito mais acima, Goiânia e outros
municípios, inclusive em Goiânia houve pontos de alagamento, pontos que nunca
haviam alagado, imagine então o nível de cheia que pegamos logo abaixo. Nada
que abalasse a expedição. Depois de tomarmos café da manhã e desmontarmos o
acampamento, resolvemos partir para mais um dia de descida, teríamos muito o
que percorrer ainda e nada poderia dar errado, mas infelizmente, deu. Em alguns
momentos da descida alguns pescadores começaram a nos alertar a respeito de uma
cachoeira que existia no rio, alguns falavam que dava pra passar, outros diziam
que não era possível. Havíamos marcado o ponto da cachoeira no GPS e tínhamos a
distância correta para evitar surpresas desagradáveis. Passamos por um barco de
um pescador chamado João, que nos advertiu a não seguir e ainda disse para
parar no rancho dele algumas curvas logo a frente que ali ele nos explicaria
algumas coisas. O problema é que a velocidade do rio estava muito alta, não
conseguimos parar no rancho, conseguimos parar somente alguns metros a frente,
mas nossos amigos que estavam no bote não pararam, tivemos então que seguir e o
que estava logo a frente foi de tirar o fôlego.
Local de subida
para o acampamento
Quando olhamos o
rio pelo satélite antes de nossa expedição, percebemos que havia algumas
manchas em seu leito, mas a imagem não estava nítida, e portanto não pudemos
descobrir do que se tratava. Descobrimos então depois, da maneira mais
emocionante possível que as manchas na verdade eram pedras, que ficavam no
fundo do rio. Como ele estava bem mais cheio, a água batia com muita força nas
pedras e formava ondas com mais de 1 metro de altura. O barulho do rio nesse
ponto é de impressionar, fomos descendo esse trecho e de repente eis que
aparece uma cachoeira no meio do rio, cada um teve um pensamento, mas todos
fomos unânimes em imaginar que todos os caiaques e o bote virariam naquele
turbilhão de água, tudo passou em câmera lenta naquele momento. Não viramos,
nem mesmo o bote, e nem o caiaque de carga que eu estava puxando. Quando
passamos do susto, o Ernesto explodiu de alegria, começou a gritar,
entusiasmado por termos superado aquele obstáculo. Que viessem os próximos
obstáculos.
Leonardo tentando
"enriquecer" a janta, sendo observado por Ernesto.
Continuando a
descida tivemos uma grata surpresa numa curva, haviam muitas pessoas reunidas
num acampamento. Logo percebemos que viraríamos atração. Assim que paramos no
local, começamos a ser cercados pelo pessoal, curiosos com aqueles malucos que
estavam descendo o rio. Estava ali o senhor Carlos, Secretário de Obras do
município de Panamá, com seus familiares e amigos. Depois das apresentações, e
muitas perguntas, as crianças que estavam no local ficaram doidas para dar uma
voltinha no caiaque. Então, uma a uma, fomos colocando o colete, e dávamos uma
volta nas proximidades do rancho. Alguns gostavam de ir sozinhos, outros por
serem menores ou por quererem uma volta um pouco maior iam comigo no caiaque
para duas pessoas. O pessoal estava bem interessado naqueles navegadores,
estavam só um pouco preocupados, como seguiria aquele grupo naquele rio bravo?
Por vários momentos o pessoal pedia para ficarmos e almoçarmos juntos.
Infelizmente não pudemos esperar, o tempo era nosso maior inimigo naquele
momento, e queríamos continuar a viagem, o mais rápido possível. Foi então que
partimos, após as despedidas e um grande saco de laranja que nos foi dado de
presente, seguimos nosso rumo, todos bastante tensos por causa da cachoeira do
Meia Ponte.
Senhor Carlos, de
camisa com listras, e amigos. Fica aqui o nosso muito obrigado à acolhida
maravilhosa que nos deram nesse pequeno espaço de tempo.
Estávamos tão
tensos que perdemos a confiança na marcação de distância do GPS que dizia que a
cachoeira se encontrava a cerca de 5 Km do local de partida, quase 1 hora de
viagem. Confiando na explicação de uma das pessoas que estavam no rancho da
curva, nos confundimos com a posição exata da cachoeira, pensamos que
deveríamos parar após a primeira ilha que aparecesse, o problema é que assim
que a ilha foi aproximando o desespero tomou conta da turma que estava na
frente, foi então que fomos com os caiaques em direção a margem para tentar
parar, o problema era que a velocidade do rio estava alta e por mais que
remássemos para parar, o caiaque não parava, fomos batendo então nos galhos da
árvores, entrando cada vez mais fundo nas margens alagadas do rio e correndo o
risco do caiaque virar por causa da velocidade que batíamos no galho. Eu entrei
na primeira galhada que vi, correndo o risco de virar o caiaque. Com muito
custo consegui desembarcar por ali, tendo que fazer um enorme esforço. O
Ernesto e o Leonardo encontraram um remanso e lá parou. No remanso, quando já
estavam bem próximos da margem, o Ernesto resolveu desembarcar. Ele achava que
o local era raso, foi descer do caiaque com o GPS pendurado no pescoço, quando
deu o passo para entrar na água afundou de uma vez. O local era muito mais
fundo do que ele esperava. A corda do GPS arrebentou e por sorte o GPS caiu
dentro do barco. De qualquer forma não haveria problema do GPS entrar em
contato com a água, pois ele é a prova d'água. O problema maior seria se ele
descesse rio abaixo. Passado o susto, ele puxou o caiaque para perto da margem
e ali descansou um pouco, imaginando o que poderia ter acontecido comigo.
o som ensurdecedor
das águas
Ernesto e Leonardo
tiveram a ideia de tentar achar a tal cachoeira, e entraram por trilha que
seguia seu rumo para longe do rio. Tentaram então descobrir um novo caminho e
entraram dentro de um pasto, sempre orientados com o barulho do rio. Sabiam que
não havia como se perderem. A medida que o barulho se tornava mais forte,
entravamos na mata que margeava o rio para ver se a tal cachoeira aparecia.
Infelizmente o barulho era apenas de corredeiras ou da água batendo no galho
das árvores. Após uma longa caminhada por caminhos desconhecidos, e a ameaça de
chuva e raios que nos amedrontava, descobrimos apenas que fomos precipitados,
que a cachoeira não estava perto como havíamos imaginado, e todo aquele pânico
gerado foi desnecessário, que poderíamos ter confiado na marcação do GPS e
avançado um pouco mais. Não só descobrimos que ainda estávamos longe da
cachoeira, como também que poderíamos descer até um certo ponto, onde o rio
ficava mais calmo em uma das margens e de lá, novamente por terra, tentar
chegar até a cachoeira. Resolvemos voltar e então avisar os companheiros as
nossas descobertas.
Nesse meio tempo,
consegui abrir caminho pela vegetação espinhosa da margem esquerda do rio,
chegando até onde Ernesto e Leonardo haviam encostado. Encontrei Érica e a esposa
do Leonardo, sentadas por ali. Tentei seguir a trilha dos meninos mas perdi os
rastros deles depois que deixaram a margem do rio e seguiram pelo meio do
pasto.
No caminho de
volta, Ernesto ficou imaginando se estava tudo bem comigo, o que havia acontecido,
já que não escutamos sua voz após nossa parada. Talvez tivesse sido melhor
fazer contato com a equipe antes de sair explorando o terreno. Na volta
para o porto seguro descobriram que eu havia ficado preso com o caiaque no meio
da galhada num ponto mais atrás e estava bem. Felizmente todos estávamos bem,
talvez um pouco amedrontados, mas nada de ruim havia acontecido, com exceção de
um remo que foi embora na bagunça. Um novo desafio começou a se estabelecer a
partir do momento que imaginamos como iríamos tirar o meu caiaque do meio das
galhadas. Uma das soluções era esvaziar o caiaque e sair por dentro da mata até
o lugar seguro, onde o inflaríamos novamente. A outra opção era passar pelo
meio das galhadas, de forma controlada, em meio ao nervoso rio. Essa segunda
opção era a mais rápida, porém a mais complicada. Ernesto resolveu encarar
bravamente a segunda opção, munido de colete salva-vidas e o eu com uma grande
corda. Ernesto foi primeiramente rebocando o caiaque até um ponto onde seria
possível subir nele e tentar sair do local de forma segura. A água do rio nesse
ponto estava muito forte e eu ia apoiando nos cipós que encontrava para
conseguir levar o caiaque. Ao chegar num ponto que consideramos ideal, subiu no
caiaque e amarrei uma grande corda nele, essa corda seria segura pelo Paulo até
eu sair de um ponto de galhadas e ter total controle do caiaque. Foi o que
ocorreu e felizmente conseguiu passar incólume e chegar ao remanso onde o resto
da turma estava.
A foto não
consegue expressar a tensão dessa parte do rio.
Conversamos por
algum tempo e resolvemos seguir viagem até chegar na parte do rio onde era
seguro parar. Nervos a flor da pele, algumas discussões aconteceram por conta
do medo que insistia em imperar, nessas discussões Ernesto e Erica discutiram
porque ela não quis descer um pouco mais onde havia uma parada. Insistiu em
ficar em um ponto onde era mais difícil sair, e foi andando a pé pelo meio do
mato, e ele, com um caiaque de duas pessoas e um de carga amarrado atrás foi
deixado a própria sorte preso a alguns galhos que teimavam em me agarrar. Num
surto de raiva remou com toda força e conseguiu se livrar daquela galhada,
chegando ao ponto onde queria parar. Nesse momento, todo reunidos, eu, Ernesto
e Leonardo fomos em expedição procurar a temida cachoeira enquanto as moças
ficaram indefesas na beira do rio, a espera dos maltratados em busca de
informação.
Andamos durante um
bom tempo pela margem do rio, atravessando brejos e pequenos córregos e também
no pasto. Em uma dessas caminhadas pelo pasto, eu fui surpreendido por uma
cascavel que avisou com seu guizo de que estava na área e não queria confronto.
A cobra partiu em fuga pelo mato, sumindo em poucos segundos. Continuamos
a caminhada, meio temerosos com a possibilidade de novas cobras. Por sorte não
avistamos mais nenhuma. Após a chegada em uma praia, tiramos uma foto do rio
revoltoso, pouco antes da cachoeira. Na praia havia bastante garrafas pets,
resultado do lixo jogado em Goiânia que viaja por vários quilômetros dentro do
rio. O barulho no local era muito alto, o volume de água era enorme, sabíamos
que estávamos chegando, mas ainda faltava mais caminho a percorrer.
Quando
estávamos no meio do mato conseguimos avistar a tal cachoeira. As águas do rio,
violentas no local mostrava que existia razão para temermos aquela cachoeira,
que apesar de não ter os 4 metros de altura como havia sido dito, possuía uma
imagem que nos provocava ao mesmo tempo medo e admiração. Depois de
fotografarmos o local e olharmos um pouco como era a cachoeira e o rio logo
a frente, chegamos a um pequeno rancho onde ficamos pensando o que
fazer naquela situação. Teríamos que voltar e como já estava começando a ficar
um pouco mais tarde não optamos por voltar pela margem e sim seguir uma estrada
que, embora mais longe, provavelmente chegaríamos mais rápido e seria menos perigoso
por conta de animais peçonhentos.
Devido à cheia do
rio, a falada queda da cachoeira estava encoberta, o que
produzia ondas e um
som assustador.
Logo no início de
nossa caminhada nos deparamos com um grande lamaçal no meio da estrada. Eu
pisei em um grande espinho de tucum, um tipo de palmeira com grandes espinhos,
que passou até pela sola da minha sandália. Depois de sairmos de dentro da mata
e caminharmos bastante houve uma divergência entre o Eu e o Leonardo
sobre qual caminho seguir. Eu dizia que seria melhor seguir a estrada até
chegar até a uma fazenda e depois descer em direção a área onde havíamos
deixado as meninas e todo o equipamento, evitando passar pela vegetação
rasteira, brejos e matas (para evitar as cobras). Já o Leonardo achou que seria
melhor seguir por um outro caminho que provavelmente era mais próximo, porém
mais incerto. Após um certo mal estar, seguimos pelo caminho proposto pelo
Leonardo. Durante nossa caminhada, em alguns momentos o caminho se tornava
confuso e era preciso parar e analisar a direção a ser tomada. Tínhamos que nos
apressar pois estava ficando escuro. Um momento tenso foi quando chegamos a um
brejo e tivemos que atravessa-lo. Estávamos com sede e com fome. Em um certo
ponto chegamos até um córrego que passava por uma espécie de vala, onde tivemos
que pular. Continuamos até mais a frente. Começamos a gritar, chamando pelas
meninas para ver a localização exata de onde elas estavam, pois desconfiávamos
que elas estavam perto. Apesar de não ouvirmos resposta aos chamados,
conseguimos chegar a uma estrada (que era por onde nós sairíamos se tivéssemos
seguido o caminho que eu havia sugerido) que por sorte nos levou exatamente
onde estava nosso equipamento, a Erica e a Cristiane. Já estava escurecendo e
fomos buscar um local para passar a noite. Havíamos avistado um rancho na
descida do rio quando estávamos buscando um remanso para a parada. Fomos
caminhando até o rancho, passando por uma trilha limpa, que chegava numa
estrada maior que subia por um pequeno morro até a chegada ao
rancho.
A situação do
nosso equipamento.
No rancho tentamos
encontrar a pessoa que morava no local para podermos pedir autorização para
ficarmos. Nesse meio tempo escutamos um barco descendo o rio. Como estávamos
perdidos, sem nenhuma ideia de que ponto a gente se encontrava, corremos para
pedir ajuda para o pessoal do barco. Descobrimos que um dos barqueiros era um
pescador que havíamos cruzado com ele num ponto bem acima, o Sr. João. O
pescador João parou o barco e veio conversar conosco. Ficamos meio receosos no
início, quando não sabíamos quem era, mas depois nos tranquilizamos mais. O
João nos ajudou a trazer os nossos caiaques até o ponto onde nós estávamos,
pois, trazer os barcos por terra seria muito mais penoso. Depois nos ajudou a
subir os barcos até o rancho, além de nos ter orientado a dormir na varanda da
casa, na parte de fora, para nos protegermos melhor. Insistimos que ficaríamos
em uma área coberta por uma grama, bem na entrada para a residência. João
entrou no quintal da morada para ver se encontrava o morador, nesse instante se
deparou com uma enorme cascavel, matando-a. Mais uma vez, o medo tomou conta da
nossa equipe. Resolvemos acatar a ideia do pescador em montar nossas barracas
na varanda da casa. Antes de ir embora, passamos pra ele o telefone de nosso
amigo Renato, que estava em Goiânia e iria nos buscar num ponto muito mais
abaixo para que o João avisasse que ele não precisava ir até o ponto marcado
anteriormente, e para tentar nos resgatar no ponto onde estávamos.
A segunda cascavel
teve um fim trágico.
O pescador João
então partiu e ficamos especulando se realmente ele iria ligar para o Renato e
se iria voltar para nos resgatar. Naquele momento estávamos na mão do Sr. João.
Montadas as barracas na varanda da casa, fomos preparar algo pra comer, tomar
banho e tentar pegar sinal de celular para falar com alguém. O nível de estresse
no acampamento estava alto, pequenas discussões começavam a todo instante,
aquela situação não poderia continuar por mais que um dia.
Decidi pensar em
um plano B. Eu iria ir caminhando até a cidade de Goiatuba e, caso o Sr. João
não aparecesse, ele conseguiria orientar a ajuda até chegar a região. Não era
uma missão nada fácil, primeiro, não havia referência sobre o lugar onde
estávamos, segundo a distância era enorme, no mínimo 50 Km e não havia
água nem alimento suficiente para fazer o percurso com segurança. A noite uma
forte chuva caiu, por sorte estávamos na varanda e a chuva não nos afetou.
Fomos dormir e aguardar pela chegada do dono da chácara, ou pelo menos o
caseiro. Veio a madrugada e ninguém chegou, o dia amanheceu e novamente ninguém
chegou. Logo pela manhã decidi colocar seu plano B em pratica e parti. A ideia
era ir pedindo orientação pelo caminho, o que não foi fácil, pois quase não
havia residências por aquela vasta região. Optei por seguir o rastro de um
veículo. A chuva da noite anterior havia lavado o solo e aquele rastro era o
único e devia ter sido feito provavelmente pelo veículo do leiteiro. Deu
certo... depois de muito caminhar cheguei a uma residência, onde o pessoal já
se preparava para almoçar. Após me orientar, continuei minha caminhada. A chuva
voltou a cair, depois um sol causticante surgiu. Quando consegui atingir uma
estrada asfaltada, já no período da tarde e tentar conseguir carona, desisti. A
minha aparência não era das melhores e provavelmente ninguém iria ajudar um
"maluco sujo e mal vestido".
Uma longa jornada
a ser percorrida
Ficaram na chácara
o Ernesto, a Erica, Leonardo e Cristiane na expectativa, pelo João e por mim. O
dia então foi passando, providenciaram um almoço com alguns itens que
encontramos na chácara e que estavam à vista, mandioca, arroz e macarrão, além
de óleo que usamos para acender o fogo. Claro que depois deixaram um dinheiro
no local para cobrir as despesas, além de algumas coisas que tínhamos e não
iriamos precisar mais, como um saco de laranja e outros alimentos.
Choveu bastante
durante a noite e o nível dos córregos subiu.
O dia foi
passando, foi chegando a tarde e a noite já apontava. Ernesto e sua equipe já
estavam conformados que iriam ficar lá mais uma noite. Em um momento foram
caminhar por uma estrada, de repente percebeu que seu celular estava com sinal.
Tratou imediatamente de fazer uma ligação e falou com o Renato. Ele disse que
já estava em Goiatuba e estava com o João que havia ligado pra ele e eles se marcaram
de se encontrar na cidade. O João serviria como guia para o Renato. Perguntaram
por mim e eles disseram que ainda não haviam me encontrado.
Aqui o caminho se
dividia em três. Observem o rastro do veículo à direita.
Nesse momento,
provavelmente eu estava na entrada da cidade, exausto da longa caminhada. Com
fome e com sede eu me sentei próximo a um posto, pensando qual seria o próximo
passo. Pouco tempo depois tive a grata visão de um carro parando ao meu lado...
Renato e João vindo ao nosso encontro. Decidi ficar por ali mesmo,
aguardando-os e evitando peso excessivo no veículo.
Obstáculos pelo
caminho
A equipe que havia
ficado na chácara estava na expectativa e a noite chegou. Esperando a chegada
do pessoal avistaram uma luz, eram eles que vinham caminhando pela estrada,
ficaram muito felizes com a chegada. Depois de cumprimentar e agradecer
bastante o João e o Renato, disseram que os carros estavam a mais de 2 Km de
distância, pois eles não conseguiram passar de uma porteira que estava
trancada. Voltaram ao acampamento e as coisas já estavam todas prontas. Cada um
foi pegando um pouco das coisas, sendo que o João pegou uma carga muito pesada.
Ficaram impressionados e agradecidos, já que além de ter cumprido com a
promessa que ele havia nos feito, ele os ajudou bastante até o último momento.
Para chegar aos carros, foram caminhando por uma estrada totalmente escura,
enlameada, e usavam apenas a iluminação de duas lanternas de baixa potência e
carregavam bastante peso. Aqueles foram 2 Km super difíceis de
transpor.
Ao final da
caminhada, ainda tiveram que pular a cerca para poder chegar aos carros que estavam
sendo vigiados pelo nosso amigo Hugo que veio dirigindo um dos automóveis.
Depois de colocarem a carga dentro dos carros, começaram a viagem de volta até
Goiatuba. Perceberam que o carro já estava com o combustível na reserva.
Estavam no meio do nada e teríamos que rodar uma distância de cerca de 60 km. O
carro estava cheio e estavam dirigindo devagar por estradas que mais pareciam
labirintos em meio a canaviais. Havia grande quantidade de lama e estavam com
medo de atolar.
Entrada de
Goiatuba, para quem vem de Joviania.
Após muito rodar
na estrada de chão conseguiram chegar na rodovia. Percorremos mais uma grande
distância, com bastante subidas, pois havia uma serra para subir até chegar a
cidade. Avistaram a cidade, já estavam perto, subindo, quando o carro começou a
falhar, o combustível estava acabando. A subida então acabou, a estrada ficou
reta. Avistaram um posto de gasolina bem a frente. Estavam com medo de a
gasolina acabar. Ernesto ignorou um quebra-molas e chegando ao posto ainda
errou a entrada, passando praticamente pela contramão. Finalmente entraram no
posto e a partir dali viu que havíamos superado as maiores dificuldades. Me
encontrei com eles no posto. Segundo o Ernesto, "estava num estado
terrível. Mas nos disseram que mais cedo ele estava pior ainda, bem sujo, por
causa do caminho que ele passou. Ele nos contou de sua odisseia em meio as
estradas, sobre os caminhos que percorreu e a distância, cerca de 60 Km a pé
num único dia".
Essa cachorrinha
me fez companhia enquanto o resto da equipe não chegava. Ao fundo o posto de combustível.
"Depois
de todos reunidos, decidimos ir até uma pizzaria na cidade de Goiatuba. Depois
de comermos a pizza, deixamos o Sr. João em sua casa, agradecemos por todo
apoio e ajuda que nos deu, recompensamos ele e partimos de volta pra Goiânia,
cansados demais, mas, no meu caso, eu não estava nem um pouco arrependido de
nada que havia feito, na minha visão, uma aventura e tanto e, como disse o
Paulo, aventura sem sofrimento é passeio!", disse orgulhoso o meu parceiro
de aventuras, Ernesto.
Uma coisa é
certa... ainda vamos ultrapassar este ponto passando por cima de toda aquela
corredeira que nos amedrontou.
Ernesto, João (Pescador), Renato e Castilho
OUTUBRO DE
2011
O RETORNO
Passado o susto e o cansaço, em 2011 resolvemos voltar ao rio Meia Ponte, no município de Panamá (GO) para verificar a tal "cachoeira" que tanto nos assustou.
Ernesto e Castilho, na cachoeira do rio Meia Ponte
Com o rio baixo, seria o ideal para fazer uma boa observação do local, já que da primeira vez que chegamos ali o rio estava tão cheio que chegava a invadir as margens do seu leito.
A queda atravessa todo o leito, de uma margem à outra
Na época da cheia o local é assustador, ao contrário do que aconteceu na seca.
PC, cara que aventura! Meus parabéns pelo desprendimento e, na verdade, a visão e a atitude ecológica e humanitária. Como diz o poeta "é preciso ter cara..."
ResponderExcluirCara, cês são malucos... eu não chegaria nem perto dessas águas... mas foi uma aventura e tanto! Parabéns. :D
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