segunda-feira, novembro 17, 2008

REMARCAÇÃO DO CENTRO GEOGRÁFICO DO BRASIL



Expedicionários no CENTRO GEOGRÁFICO DO BRASIL

REMARCAÇÃO DO CENTRO GEOGRÁFICO DO BRASIL EXPEDIÇÃO SÉRGIO VAHIA

SETEMBRO/OUTUBRO 2008

Por Roberto Percinoto



Hotel em Barra do Garças, primera parada dos expedicionários

Tudo começou há cerca de dois anos quando o Sérgio Vahia teve a idéia de fazer a remarcação do Centro Geográfico do Brasil. Logo no início, esbarramos com um problema que parecia ser de fácil solução. Quais as coordenadas do Centro? Começamos pesquisar o assunto. Dirigimo-nos ao Serviço Geográfico do Exército no Morro da Conceição no Rio de Janeiro. Para nossa surpresa, o Exército brasileiro não tem em seus arquivos essas coordenadas. Depois, foi a vez do IBGE, que também não tem registro. Resolvemos procurar na Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro, ali também não tem registro. Já que estava na Biblioteca Nacional, resolvi folhear o livro The Heart of the Forest do cineasta inglês Adrian Cowell, escrito na década de 1960, que também participou de expedição de 1958, chefiada pelos Irmãos Villas Bôas. Lá estava a composição do toda a Expedição de 1958, inclusive com uma foto do Sérgio Vahia marcando o rumo da picada com uma pequena bússola e em outra foto entalhando o marco de madeira com uma faca de combate, mas sem nenhum registro das coordenadas. Onde achá-las? Não se tinha a menor idéia. Eis que, um dia, o Sérgio vasculhando seus arquivos na pousada de sua filha em Arraial do Cabo, a Fernanda, achou tudo o que a gente procurava: recortes do Correio da Manhã de 1959 dando conta da expedição e o mapa, com as coordenadas do Centro, determinadas pelo geólogo Franklin de Andrade Gomes, responsável técnico pela localização e marcação de Centro em 1958, contratado pelo Governo Federal. Ele era funcionário da PROSPEC, empresa especializada na pesquisa para localização de recursos minerais. Mais tarde trabalhou na NASA, quando veio a falecer de um infarto. Conhecidas as coordenadas do Centro – 10º 20’ S e 53º 12’ W de Greenwich – o Sérgio começou a organizar a nova expedição. Elaborou um esboço de orçamento que previa custo de cerca de R$40.000,00, com os seguintes itens básicos: barcos, motores, gasolina, alimentação, transporte, presentes etc. Em seguida, iniciou gestões junto à FUNAI para obter autorização para ingressar no Parque Indígena do Xingu, o que foi feito pelo Guilherme Carrano, sobrinho de sua mulher, a Irani.



Rodo-Hotel, em Nova Xavantina, segunda parada dos expedicionários.

Vencida essa etapa, surgiram novas necessidades. Seria possível encontrar quem financiasse a expedição? Pensamos inicialmente que a TV Globo se interessasse pelo projeto e pudesse nos ajudar. Falamos, com o Rogério Marques, que na época era um dos editores do Fantástico e com a Maria Luíza, que é jornalista especializada na questão indígena. A direção da Globo não aprovou o projeto. Bem, a partir daí saímos à procura de ajuda. Falei com o meu amigo Roberto Motta Brandão que é aposentado de Petrobras e ele me deu o caminho das pedras.

Alunos da Universidade de Nova Xavantina ouvindo atenciosamente à palestra ministrada por Sergio Vahia.

Conseguimos o patrocínio de quatro barcos e três motores, que aliás ainda não foram totalmente pagos pela Petrobras. Nesse ínterim, surgiu a possibilidade de se fazer um filme da expedição através de um contato de sua filha Fernanda. O projeto amadureceu e a equipe de filmagem esteve presente do início ao fim da expedição fazendo as filmagens. O filme deve ficar pronto no segundo trimestre de 2009. O filho do Sérgio, que se chama Sérgio Vahia Filho, que é mais conhecido como Tito, veio dos Estados Unidos, onde reside há 13 anos, especialmente para se integrar à expedição. Trouxe de lá uma filmadora Sony e gravou 7 horas, documentando a expedição em seu dia-a-dia. Seu projeto é editar toda essa matéria em DVD.

Daniel Santiago e Sergio Vahia, durante palestra

O Sérgio, como sempre faz quando se envolve em um projeto, trabalhou duro para sua montagem e execução. Não mediu esforços nessa empreitada.

Ele pagou do próprio bolso todas as despesas de transporte, alimentação e presentes para as aldeias indígenas. Só de anzol e linha de pescar comprou 90 quilos, que foram sendo distribuídos em cada aldeia que a expedição passava às margens do rio Kuluene e Xingu até a balsa na BR-080, que fica a 42 Km da cidade de São José do Xingu.

Entrada principal da belissima cidade de Água Boa

A Expedição saiu de Goiânia em direção a Brasília quando teve início formal em direção ao Centro Geográfico do Brasil para as tomadas de imagens para o filme. Dali voltou para Goiânia e partiu para Barra do Garça no dia 21 de setembro de 2008. Depois seguiu para Nova Xavantina e Canarana, onde permaneceu por alguns dias. No dia 27 de setembro partimos em direção ao rio Kuluene na aldeia do Kuikuros, que fica próximo da cidade Gaúcha do Norte. No caminho, passamos pela Fazenda Hotel Xingu, compramos cerveja e conversamos com o gerente Clarí. O dono do hotel estava lá com o seu avião estacionado e nos deu boas informações sobre a distância dali à aldeia dos Kuikuros. Chegamos a essa aldeia já era noite. O Jairo, índio kuikuro, que mora em Canarana já estava lá a nossa espera, pois ele foi à frente de moto e estava encarregado pelo Piracumam, que é irmão do Aritana, de nos guiar até o rio Kuluene.



Visita feita a Piracuman, em Canarana


Em Canarana, cidade com grande contingente de gaúchos que para lá se deslocaram em busca de terras para plantar soja, compramos os últimos itens para a expedição, tais como: cartuchos, chumbadas, anzóis pequenos, iscas de soja e minhocuçu. Canarana foi o ponto final de partida da expedição da parte considerada integrada à civilização moderna, isto é, com Internet, bancos, hotéis, restaurantes etc. Dali para frente, ingressamos em outro mundo, o mundo dos rios, das matas e, naturalmente, dos peixes e dos bichos, os mais variados como onças, antas, capivaras, pacas, porcos-do-mato, cutias, mutuns, jacus, cujumins, macacos pregos e coatás, jacarés, tracajás, tucunarés, pintados, cacharas, armal, barbado, bicuda, corvina, curimbatá, jaú, jurupoca, mandi, mandubé, piranhas preta e caju, matrinxã, traíra, trairão, pacus, pacus prata e peva, pirararas, piraíba, piau, e piau três pintas, cobras etc. Outra novidade foram as abelhas africanas e nativas, que nos abordavam permanentemente em razão de suas necessidades de sal. Esse era o mundo que nos esperava e que continua lá graças à existência do Parque Indígena do Xingu. Acho que se não fosse a existência desse Parque, os fazendeiros já tinham derrubado a mata até às margens do Xingu para criar bois e plantar soja. O trajeto percorrido pela expedição, dos kuikuros ao porto de entrada do Centro no rio Xingu, foi de cerca de 400 km durante cinco dias.

Vão aqui, resumidamente, as principais informações do dia-a-dia da expedição, a partir de Canarana-MT.



Hotel Pollyana, em Canarana


24 de setembro de 2008.
Viajei do Rio à Goiânia pela GOL. À noite viajei de ônibus para Canarana da viação Xavante. Comprei em Goiânia o livro Marley e Eu e o perdi no mesmo dia. Acho que o deixei no táxi no trajeto do aeroporto à rodoviária. Jantei e tomei cerveja na rodoviária de Goiânia. Embarque às 9 horas. Já de madrugada foi acordado pelo movimento dos passageiros que comentavam a existência de um acidente na estrada. Um caminhão havia capotado na altura da cidade de Iporá. Estava carregado com um container, que ficou atravessado na estrada e demorou duas horas para ser retirado.




Paulo Castilho e Percinoto


25 de setembro de 2008.
Cheguei em Canarana às 10:30 horas. Fui direto para o hotel Polyana onde me encontrei com o Sérgio, Tito, Odone, Paulo Castilho e a equipe de filmagem. O resto dia permanecemos em Canarana. Sem novidades.

26 de setembro de 2008. 

Entrevista cedida à radio e jornal de Canarana

Véspera da partida em direção ao rio Kuluene. Pela manhã, tomamos algumas providências. Abastecemos o caminhão, enchemos trinta e quatro galões de gasolina com vinte e sete litros cada, cerca de 900 litros. Tivemos que retirar os quatro barcos de cima do caminhão para acomodar esses galões na carroceria. Depois dessa batalha, fomos à casa do do Kanikô, indio suiá, que mora em Canarana, pois soubemos que havia estado no hotel a procura do Sérgio. Este índio era garoto quando o Sérgio foi sozinho na aldeia deles em 1959. Ele repetiu toda a história do tiro que o Sérgio deu e do gesto que o Cuiuci fez ao botar a mão no coração dele com a finalidade de saber se ele estava com medo. Confirmou também que os índios tremiam muito, na verdade eles estavam com medo daquele caraiba que chegou lá na aldeia à noite e completamente nu. Só podia ser um grande feiticeiro. À noite, fomos em comitiva à casa do Piracuman, que nos aconselhou a colocar os barcos no rio Kuluene na altura da aldeia dos Kuikuros, já que o rio se encontrava muito baixo, o que poderia nos causar problemas na navegação em função de existência de muitas pedras nessa região do rio. Neste dia, o Rogério Marques da TV Globo me telefonou informando que a Globo se interessou pela matéria e que havia contratado os serviços da TVCA (TV Centro América de Cuiabá) para fazer a cobertura da expedição. Falei com a Mônica, produtora da TVCA, e combinamos que quando a gente chegasse em São José do Xingu falaria com ela para fixar a data em que a equipe deveria chegar em São José do Xingu. Inicialmente fixamos a data de 13 de outubro, depois modificamos para 19 em função de atrasos naturais nesse tipo de trabalho, a chegada do marco prevista para o dia 17 e a chegada do Adrian Cowell que ficou para o dia 20 de outubro.



27 de setembro de 2008.
Início da nossa grande jornada. Levantamos cedo, tomamos café, fizemos a checagem final e partimos em direção à cidade Gaúcha do Norte que fica na direção do caminho que fizemos. Levamos uma índia kuikuro e seu filho excepcional de 15 anos. A distância que tínhamos que percorrer era de cerca de 370 km em estrada de chão e atravessar algumas pontes bem precárias para suportar o peso do caminhão que levava os barcos e toda nossa tralha da expedição: panelas, baldes, chaleiras, bules, pratos, garfos, colheres, víveres em geral, objetos de uso pessoal, machados, foices, facões, trempes feitas de vergalhões pelo Sérgio, oito toldos de plásticos de 10m por 10m. Levamos também três grandes caixas de madeira também confeccionadas pelo Sérgio com a finalidade de guardar nossos pertences e os víveres no acampamento base no início da picada no rio Xingu, todas com cadeados. Detalhe importante: todos os víveres, roupas e etc foram acondicionados em 15 mochilas, confecção Sérgio Vahia, por causa das chuvas que são uma constante naquela área a partir do mês de setembro. Um saco de pano dentro de dois sacos de lixo, que eram colocados dentro de outro saco de ráfia - desses encontrados em padaria - duas rolhas amarradas na inferior em um dos lados do saco que servem para se prender as alças da improvisada mochila. Coisa simples, barata e prática. Pode chover a vontade que não molha e de transporte fácil e cômodo. Na entrada em direção ao território indígena há uma pousada de nome Kuluene. Seu dono tem avião. Há um contraste muito grande entre os brancos, caraíbas, e o modo de vida dos índios. O Jairo que ficou encarregado de nos guiar seguiu um outro caminho de moto. 

Paulo Castilho - "viajando de canoa" sobre a carroceria de caminhão


Passamos por três aldeias kuikuros. O cacique da última aldeia chama-se Jacalo. Dormimos no porto às margens do rio Kuluene. O Paulo Castilho, que nos acompanhou até este porto, viajou de Canarana até aqui em cima da carroceria do caminhão. Chegou ao destino coberto de poeira, mas cheio de animação. Grande companheiro, pena que, por motivos de ordem pessoal, não pode nos acompanhar até o Centro. O Jairo dormiu com a gente no porto na primeira noite.


Estrada típica da região do Xingu


28 de setembro de 2008.
Permanecemos no porto Kuikuro. Pela manhã, o Jacalo passou por lá em direção a Vapuru, local onde se daria uma conferência sobre saúde com a participação de todos os caciques do Xingu, promovida pelo ministério da saúde. Antes de embarcar Jacalo pediu ao Sérgio um dos barcos da nossa comitiva como forma de pagamento pelo fato de termos usado a sua estrada até aquele porto. Excelente pedágio, isto é, cerca de R$12.000,00. Os outros barcos, três, já estavam prometidos ao Raoni. Combinamos então que a entrega desse barco se daria na balsa na BR-80. O Jacalo designou um índio para nos acompanhar e depois voltar com o banco. Esse índio viajou com a gente de Pavuru até a primeira parada que fizemos numa praia. Não conseguimos saber ao certo a razão de sua desistência. Acho que ele tinha que participar da uma conferência de saúde em Barra do Garça por aqueles dias. Quando chegamos na balsa, o Jacalo já estava lá para regressar com o barco. Durante o dia recebemos a visita de vários índios que tentaram nos vender vários objetos feitos por eles ou para pedirem alguma coisa. No final da tarde fomos visitados por um grupo mais desenvolto em seus pedidos, queriam barcos, entre outros objetos. Pediram a bota do Odone e também quiseram levar a minha sandália. O Odone tentou argumentar que ia precisar das botas para caminhar na mata e o índio foi curto e grosso “você não precisa de botas, pois já que tem tênis”. O Odone foi duro com ele e ficou com botas e tênis. Em vista disso, resolvemos sair bem cedinho para evitar a presença desses ousados índios.



29 de setembro de 2008.
Para nossa surpresa, os kuikuros chegaram bem cedo no porto, mas nós já estávamos de partida. Saímos de lá às 7h e 40min em direção à BR-80. O Sérgio pretendia parar em uma aldeia para visitar um velho amigo de nome Patacu da expedição de 1958, cozinheiro daquela expedição que colocou o primeiro marco do Centro. À tarde chegamos a uma aldeia dos kamaiuras. O Sérgio ficou conhecendo a filha do Munhum que foi também seu amigo nas viagens que fez por vários anos ao Xingu. Como havia neste local muitas pedras no rio, um grupo de índios nos ajudou na estreita travessia com as nossas quatro canoas. Logo a seguir, como já era tarde, resolvemos montar um acampamento e os índios simplesmente ficaram nos observando, depois retornaram à aldeia. Momentos mais tarde voltaram armados de flechas e bordunas e nos disseram - vocês precisam partir ainda hoje, pois recebemos um rádio de Pavuru informando que vocês devem ir para lá hoje. Não tivemos alternativa.



Levantamos acampamento e partimos para Pavuru. De repente, formou-se um grande temporal e houve banzeiro. Trata-se de um vento forte encanado no rio. O rio fica todo encapelado e é perigoso viajar nessas condições, principalmente à noite. Por sorte, avistamos luzes à margem do rio. Eram mulheres que estavam tomando banho. Fomos até lá e verificamos que se tratava de uma aldeia NE Trumai. Elas levaram o Tito à presença do chefe Aroldo. Momentos depois, o Tito regressou ao porto dizendo que o chefe Aroldo nos autorizou a dormir na aldeia. Ele nos recebeu muito bem. Trata-se de uma figura simpática, domina bem o português e está bem atualizado em relação ao presente momento em que vivemos. Ele nos acomodou na casa comunitária, local onde todos preparam suas comidas. Foi um dos melhores momentos da nossa expedição. Essa aldeia Trumai só tem 37 pessoas. Sua língua não pertence a nenhum tronco lingüístico conhecido. Povo hospitaleiro e não nos pediram absolutamente nada. Apenas nos venderam colares e peixe defumado. Nesta aldeia, o Sérgio conheceu a viúva do Pionim, que foi criado pelos Irmãos Villas Boas, e que era também seu amigo do Sérgio. Foi o índio que mergulhou para recuperar a espingarda do Sérgio e a máquina fotográfica do Murilo no episódio da onça que subiu na canoa, isso lá pela década de 1950. O cacique dos Trumai chama-se Maricauá e estava na conferência de saúde.

 
A aldeia tem um representante em Canarana, o Alupá. Ele trabalha no escritório da Associação de Terra Indígena do Xingu – ATIX. O Aroldo tem um filho que se chama Mataiá, grande pescador de piraíba ou filhote. Seu neto é o Aruiavi, tem 11 anos, e é filho de outro filho do Aroldo chamado Aluari. Aroldo é casado com uma índia suia, já bem velha, que se lembra de quando o Sérgio deu um tiro na aldeia a mando do Cuiuci. Ela e todos tremiam de medo na aldeia, pois o tiro foi dado no porto, cerca de 300 metros da aldeia.


30 de setembro de 2008.

Levantamos cedo, como é a nossa rotina na expedição, tomamos café e partimos em direção a Pavuru. Praticamente toda a aldeia foi com a gente até o porto. As mulheres da etnia Trumai são bonitas e não mostraram nenhuma inibição com a nossa presença. Estiveram sempre presentes em todos os momentos em que lá estivemos. O Aroldo nos informou que ultimamente tem um índio bravo que os visita quase todas as tardes. Joga pau na aldeia e desaparece no mato. Eles suspeitam que o real interesse desse índio é roubar mulheres, prática muito comum entre as etnias antigamente. Eles têm esperança que, a qualquer momento, aconteça o contrário: o prisioneiro será o agressor. Chegamos por volta das 10 horas na aldeia Moigu da etnia Ykpeng, que tem como cacique o Melobu. Ele usa um adorno de pele de onça na cabeça. Este local é conhecido como Pavuru onde está se dando a conferência de saúde. Tem campo de avião e um grande restaurante, entre outras instalações. O Sérgio foi recebido por vários caciques no porto, destacando-se: Aritana, Megarom, Cuiuci, Melobu, Jacalo, Raoni, Tininim.




Durante a conferência foi dada a palavra ao Sérgio que, emocionado, falou para uma atenta platéia de caciques de todo o Xingu do objetivo de sua expedição que era resgatar uma parte da história do Brasil remarcando, cinqüenta anos depois, o Centro Geográfico do Brasil, demarcado em 1958 por determinação do governo Juscelino Kubitschek, a pedido do marechal Rondon, que teve como chefe os Irmãos Villas Bôas, e com a participação dele – Sérgio Vahia, Franklin de Andrade Gomes, geólogo responsável pela determinação do Centro, Dilton Torres da Mota, jornalista, Raimundo e Clemente, funcionários da FBC, Fundação Brasil Central, de um chileno e do jovem inglês Adrian Cowell, hoje renomado escritor e cineasta, e ainda como participantes vários índios: Raoni, Pionim, Patacu, Kramuro, Brecoché, Cobre e Pitissacá. Disse também que freqüentou o Xingu por muitos anos e que sua iniciativa de remarcar o Centro era pessoal e que não havia nenhum financiamento oficial, a não ser a doação dos quatro barcos e três motores que foram doados pela Petrobras e que seriam ao final da expedição.



Daniel Santiago

Disse mais: que pretendia remarcar o Centro hasteando a bandeira do Brasil com a presença de representantes dos três povos que deram origem ao povo brasileiro: um índio, um branco e um negro. Momento em que foi aplaudido por todos os caciques que ali se encontravam. Finalizando a sua fala afirmou que o Centro do Brasil fica em terra indígena e que talvez seja esse o motivo pelo qual houve esse grande esquecimento da demarcação do Centro Geográfico do Brasil, ocorrida em 14 de outubro de 1958. Almoçamos em Pavuru e seguimos em direção a Diauarum. Neste dia dormimos numa praia. Local não muito agradável devido a arreia fina que penetra em tudo. O índio kuikuro designado pelo Jacalo que iria com a gente até a balsa para levar o banco doado pelo Sérgio decidiu regressar para Pavuru.


Alexandre

01 de outubro de 2008.
Ao sairmos pela manhã houve um pequeno acidente com o Odone, ele deixou a máquina fotográfica cair na água. Ele não conseguiu subir no barco no primeiro impulso. Ficou muito chateado, também não era para menos.


Aluizio, o cameraman da equipe de documentaristas

Chegamos em Diauarum (auarum significa onça preta) à tarde e por lá permanecemos até o dia seguinte. Lá usamos a Internet e o Sérgio teve a oportunidade de falar para os alunos da escola estadual bilíngüe de Diauarum. Repetiu os argumentos do discurso feito em Pavuru. Os alunos e as professoras gostaram do seu desempenho e fizeram várias perguntas. Ao término, contaram para ele uma canção indígena. No final da tarde chegou o cacique dos caiabis, o Javari, que é chefe da Aldeia Capivara. Já estávamos alojados numa casa de palha cedida pelo secretário-geral da ATIX. Foi ele também que nos permitiu usar a Internet. À noite o Sérgio e os índios contaram várias histórias e relembraram momentos em que estiveram juntos no Xingu durante as muitas viagens feitas pelo Sérgio sozinho àquele lugar. Diauarum fica logo abaixo da boca do rio Suiá-missu.


Tito - Filho de peixe... peixinho é!!!!

02 de outubro de 2008.
Tomamos café e partimos em direção à aldeia Capivara dos caiabis. Neste local fizemos várias fotos e a equipe do filme fez gravações com o cacique Javari, que explicou o problema dos índios com os brancos. Dormimos na aldeia Juruna. Tinimin é o cacique. À noite houve uma reunião com os índios e eles relataram os seus problemas: falta de rádio e canoa com motor. Prometi comprar um rádio para eles. O Sérgio ficou com o compromisso de falar com o Raoni sobre a possibilidade dele ceder um dos três barcos que haviam sido prometidos por Sérgio aos txucarramães. Houve, nesta noite, uma cena engraçadíssima. O Tito resolveu oferecer beiju que ele havia comprado dos caiabis em grande quantidade, sem nenhuma cerimônia, os jurunas avançaram sobre o beiju e em menos de um minuto o conteúdo da cesta desapareceu. O Sérgio, que é um sujeito muito espirituoso, saiu-se com essa: foi igualzinho a um ataque de piranhas. Demos linha e anzóis a todos antes de sairmos em direção à balsa, que fica na BR-80. Chegamos neste local na parte da tarde. Montamos ali o nosso acampamento onde permanecemos até do dia 5 de outubro, dia das eleições municipais. Faço aqui um registro que parece desnecessário, mas que para mim tem grande significado. É a primeira vez que deixo de votar desde 1958, quando votei pela primeira vez em uma eleição municipal em Astorga-Pr para me incorporar a uma expedição. Esse compromisso eu havia assumido com o Sérgio há cerca de dois anos. Não votei no primeiro turno, mas tenho esperança de poder votar no Gabeira no segundo turno.




03 de outubro de 2008.
Eu, o Tito e o Daniel fomos a São José do Xingu. Ia me esquecendo, do porto dos kuikuros à balsa na BR-80, levamos quatro dias descendo o rio Kuluene e depois Xingu. Passamos na aldeia Piaraçu, onde fica a guarita de cobrança para a travessia dos veículos na balsa, montada pelos índios. Lá encontramos a Raoni que nos pediu para comprar fumo para a aldeia. Dormimos em São José do Xingu no hotel Elite. Seu dono e também recepcionista é o Nego. A diária é de R$40,00 com ar condicionado. Só não fornece sabonete. Quem desejar tomar banho com sabonete precisa desembolsar mais R$2,00. É assim que a coisa funciona por aquelas paragens. Liguei para casa, para a Irani, para a mulher do Odone, para a Mônica da TVCA, passei e-mails para várias pessoas, dentre elas, o Paulo Castilho, Mônica da TVCA, Rogério Marques da TV Globo e familiares. No dia seguinte, fizemos algumas compras e retornamos ao acampamento na balsa. O Sérgio, o Odone, o Alê, o Guto, o Francis e o Aloísio ficaram no acampamento às margens do Xingu na balsa. Afinal, alguém tem que tomar conta do acampamento, pois os índios são muito curiosos. O Daniel ficou na cidade.


04 de outubro de 2008.
Eu e o Tito retornamos a São José. Os demais permaneceram acampados na balsa. Sem novidades. Quando retornamos, o Raoni estava no nosso acampamento. No final da tarde fomos avisados que o Raoni iria nos levar no dia seguinte ao local do início da picada, bem abaixo da onda estávamos. Cerca de 40 Km ou três horas de barco. O Daniel chegou da cidade e trouxe cerveja e pães, entre outros produtos comestíveis.


05 de outubro de 2008.
Hoje é dia de eleição em todo o território nacional. Não vou votar desta vez. Entre votar e participação da expedição, a opção foi pela expedição.
Conforme combinado, o Raoni chegou às 8 horas para nos levar ao local onde foi instalado o acampamento base, onde foi iniciada a picada em 1958. Coordenadas: 10º 20.081’ S e 53º 02.032’ W. Ele foi à frente levando o Sérgio. Antes, porém, foi à aldeia Piaraçu ligar para a Mônica da TVCA para combinar a vinda dos repórteres. Marcamos para o dia 19 no hotel Elite em São José do Xingu. Eles virão de avião próprio. No dia anterior havia falado com o Olmir de São José do Xingu sobre o assunto. Chegamos depois do Raoni foi na frente com o Sérgio e o Francis. O encontramos de volta já bem distante do local. Nos pediu coca-cola e seguiu viagem. Chegamos ao local do acampamento base logo depois. Foi fácil achar pois o Sérgio colocou camisetas brancas para sinalizar a entrada. Ali nos instalamos e permanecemos até o dia 23 de outubro, data em que foi finalmente desmontado, sinalizando o fim da expedição. Dali ao Centro São 18,460 Km, nas coordenadas: 10º 20’ S e 53º 12’ W. O resto do dia foi dedicado para montar os quatro toldos de 10m x 10m, que serviram de barracas durante o período de feitura da picada, seja como acampamento base e depósito de víveres e ferramentas.


06 de outubro de 2008.
Uma segunda-feira. Iniciamos hoje a picada em direção ao Centro. Eu, Odone, Tito, Tarepá e o Kokokunti como picadeiros. O Sérgio veio nos acompanhando um bom trecho, depois voltou ao acampamento base. Fizemos no primeiro dia 1,7 Km. Para início da nossa missão, foi um bom começo. O processo consistia no seguinte eu com o GPS Mapsource 60 CSX e o Odone com a bússola. Um conferia o outro. E assim fomos caminhando pela densa mata. O primeiro dia serviu como aprendizado.


07 de outubro de 2008.
Segundo dia de picada. Levantamos cedo, tomamos café, preparamos marmitas com o nosso almoço e fomos à luta, agora acompanhados por mais dois índios: Medjai e Meuban. O Tarepá é um juruna e tem aldeia em Piaraçu. É filho do Pitissacá, amigo do Sérgio desde a primeira marcação do Centro em 1958 com os Irmãos Villas Bôas. O Medjai é cacique chefe da aldeia de Piaraçu, que fica bem próxima da balsa na BR-80. O Meuban é seu genro e desfruta de um posto elevado na hierarquia da aldeia. O Kokokunti é agente de saúde da aldeia do Raoni, que fica uns 3 Km acima da cachoeira Von Martius. À tarde voltamos ao acampamento base. Fizemos mais uns 2 Km.

08 de outubro de 2008.
Reiniciamos os trabalhos da picada bem cedinho. Ainda pela manhã encontramos a primeira água. Mais tarde encontramos novo riacho, onde decidimos montar um novo acampamento. Levamos panelas, víveres em geral e redes. A partir da montagem desse acampamento nos deparamos com uma nova realizada: abelhas africanas e nativas em grande quantidade. Os mosquitos são poucos em relação às abelhas. Elas têm carência de sal, razão pela qual se aproximam para se fartarem do nosso suor. Em geral não picam. Quando amassadas, aí a ferroada é certeira. Dormimos somente uma noite nesse acampamento. À noite recebemos um mensageiro índio que levava uma mensagem para o Bedjai e o Meuban. Eles deviam regressar à aldeia para receberem um veículo que havia sido doado para aquela comunidade.



09 de outubro de 2008.
Mudamos de acampamento novamente em razão do ataque das abelhas e para facilitar a nossa trajetória em direção ao Centro. Bedjai e Meuban regressaram à aldeia Piaraçu. Prosseguimos com o Tarepá e o Kokokunti e mais outros índios que vieram em substituição aos retornados. Chegaram o cacique Bebitoque, que não fala uma palavra em português, seu filho e o Kiabieti, que é chefe de aldeia abaixo do nosso acampamento base. Neste dia e no dia anterior os índios mataram macaco prego. Eles adoram esse tipo de carne. Não saberia explicar se é por apreciar o paladar da carne ou por uma questão religiosa, atávica, etc. Nessa altura dos trabalhos, já havíamos ultrapassado a metade do nosso trajeto. Regressamos ao último acampamento. Decidimos levantar bem cedo e num grande esforço chegar ao Centro.


10 de outubro de 2008.
Como sempre, preparamos as nossas marmitas e marchamos para o Centro. Depois de uma longa caminhada, chagamos a conclusão que não seria possível chegar ao Centro naquele dia. Fizemos em pequena reunião para avaliar o que fazer. Eu, o Tito, o Kokokunti e Kiabieti decidimos prosseguir na feitura da picada até mais tarde. O outro grupo de índios resolveu voltar ao acampamento. O cacique Bebitoque nos informou que nós estávamos perto de um grande córrego e que deste ponto ao Centro não era muito longe. No final da tarde nos deparamos com o tal córrego. Bem, aí deixei o achômetro de lado e tirei nova posição com o GPS. Estávamos na latitude 53º 10.689’ W, portanto a 1.311 milhas, o que corresponde a 2, 428 Km. Essa era a distância que tínhamos que percorrer fazendo picada.Tomamos outra decisão, agora os quatro restantes picadeiros. Não voltar ao acampamento anterior. A partir daquele momento tínhamos que resolver um outro problema, pois só nos testava uma pequena marmita com farofa e arroz para quatro homens famintos. Água não era problema, pois estávamos à beira do córrego. Solução encontrada pelo Kiabieti. Matou um macaco prego e o moqueou à moda indígena, com pelo e tudo, retirando apenas as vísceras. O jantar estava completo. Farofa com arroz e macaco moqueado sem sal ou qualquer outro tempero. O Kiabieti, rapidamente montou um novo acampamento com a nossa ajuda feito de folhas de bananeiras do mato. As folhas servem para cobertura e forrar o chão, isto é, nossa improvisada cama. À noite fomos atacados por uma grande quantidade de formigas cortadeiras. Fizemos fogo em volta do acampamento, mas de nada valeram os nossos esforços. Já era quase meia-noite e a gente não conseguia dormir devido às mordidas das implacáveis formigas, foi aí que me lembrei que tinha levado uma lata de neocid. Bem, com o neocid as formigas se danaram todas.



11 de outubro de 2008.
Levantamos cedo para fugir das abelhas. Elas chegam por volta das 6 horas, parece até que têm despertador e só desaparecem depois das 6h e 30min da tarde. Mais um dia de marcha em direção ao Centro, agora faltando apenas pouco mais de 2 Km. Antes porém tomamos o nosso café da manhã: o que sobrou da carne de macaco moqueado, ingerido simplesmente com água. Ligamos o GPS Garmin mapsource 60 CSX, uma maravilha da tecnologia, e partimos. Durante todo o nosso trajeto, o GPS nos orientou com precisão. Usamos o recurso auto-estrada. Basta selecionar o ponto desejado e o visor do GPS indica o rumo a ser seguido. Exatamente às 12 horas chegamos ao Centro nas coordenadas previamente salvas no GPS: 10º 20’ S e 53º 12’ W. Fizemos uma pequena clareira para identificar o lugar exato. O Tito nos filmou nesse momento com ele presente já que a filmadora foi colocada em cima de um cipó aplainado pelo Kiabieti, grande caçador, hábil no manuseio do facão e arguto observador dos movimentos e barulhos na mata. Nada passa despercebido por ele, seja o ruído de um bicho grande como anta, porco-do-mato, macaco, mutun, jucu etc ou de pequenos animais. Em seguida, voltamos ao acampamento anterior, que fica mais ou menos no meio da picada. Chegamos às 4 horas da tarde exaustos e com fome e ainda tivemos que enfrentar as abelhas. Todavia, por sorte, formou-se um temporal e elas se mandaram. Jantamos o fomos dormir.

12 de outubro de 2008.
Quando levantamos, por volta das 5:30 horas da manhã, as abelhas já estavam chegando. Arrumamos as nossas mochilas, fizemos café e partimos em direção ao acampamento base no rio Xingu. Chegamos às 10 horas. Todos nos esperavam, mas para nossa surpresa encontramos no caminho Bedjai, Meuban, Tarepá e Kokokunti levando umas marmitas com comida. Naquele momento resolvemos seguir viagem e só comer quando chegássemos ao acampamento. Depois do almoço levamos Kiabieti à sua aldeia, que fica logo a baixo do nosso acampamento. O piloto do barco foi o Kokokunti. Dei de presente um alicate de unha e um canivete ao filho pequeno do Kiabieti. Ele nos presenteou com uma grande quantidade de banana e cará. Dali seguimos para São José do Xingu eu, Tito e Tarepá pilotando o barco. Paramos no acampamento base para falar com o Sérgio. Nossa missão era ir a São José do Xingu telefonar para os familiares, a Petrobras para verificar se os motores já tinham sido pagos, para a TVCA sobre a reportagem, entre outras providências. Regressamos no dia seguinte na camionete do Tico. No dia anterior quando fomos para a cidade pegamos carona em caminhão de transportar bois. Inicialmente ficamos em cima do teto de carroceria, mas com o tempo vimos que era perigoso, pois a estrada com muitos buracos davam grandes os solavancos. Pulamos para o fundo da carroceria, onde os bois ficam. A partir daí foi muito engraçado. Dois sujeitos sendo transportados num caminhão de boi. O Tito filmou a cena da gente dentro da carroceria. Ia me esquecendo, em São José do Xingu não tem agência de banco. A Caixa Econômica tem um convênio com um supermercado, aquele programa Tem Caixa Aqui. Como já estava quase sem dinheiro resolvi ir até lá fazer um saque. Surpresa: só havia R$15,00 no caixa. Uma lástima esse serviço. Não funciona, pois só tem dinheiro se houver depósito. Como os clientes da Caixa são poucos por aquelas paragens, normalmente não há dinheiro em caixa. Por sorte, um dia passei por lá e consegui sacar R$200,00. Ainda bem que o Sérgio levou bastante dinheiro e cheques. Fiz um vale de R$400,00 com ele. Para comprar gasolina o cheque funcionou. Além dos telefonemas usamos também a Internet para dar conta da nossa incursão na mata aos familiares e ao Paulo Castilho que editou a matéria em seu blog.


13 de outubro de 2008.
De volta ao acampamento base. Trouxemos fumo, lanternas, isqueiros, botina para o Tarepá, sandália para o Kokokunti, anzóis, pilhas etc. O acampamento estava todo iluminado com o gerador da equipe de filmagem. Trocamos informações, demos notícias dos familiares do Sérgio e do Odone. Quando chegamos ao acampamento ficamos sabendo que a equipe do filme irá, no dia seguinte, para São José passar alguns dias por lá e que o Sérgio irá iniciar a sua caminhada em direção ao Centro. Fiz uma previsão de que ele levaria entre 5 e 6 dias para chegar. Levou 7.

14 de outubro de 2008.
Sérgio levanta cedinho e se prepare para ir até o Centro. Foram junto com ele Tito, Odone, Kiabiete, Bedjai, Meuban, Bebitoque e seu filho e Kokokunti, mais o Francis, que embora funcionasse como apoio da equipe de filmagem preferiu acompanhar o Sérgio. Portanto, esta comitiva era composta de 10 pessoas: 4 brancos e 6 índios. Com mais um formaria um grupo dos onze do Brizola. Eu e o Tarepá ficamos encarregados de tomar conta do acampamento base. A equipe de filmagem (Daniel, Aloísio, Alê e Guto) fez as cenas iniciais e seguiu com a comitiva até um pedaço da picada e depois foram para São José do Xingu levados pelo Tarepá para um período de descanso. Fiquei sozinho no acampamento. Durante o dia pude fazer algumas coisas, entre elas, a confecção de 3 lamparinas com latas de massa de tomate. O combustível usado foi querosene, mas poderia também funcionar bem com óleo de cozinha, que havia em quantidade razoável no acampamento. O Tarepá voltou já era noite. Veio com ele o Tabai, seu filho de onze anos. Desta vez, o Tarepá trouxe além da espingarda arco e flechas.


15 de outubro de 2008.
Pela manhã, fizemos uma grande faxina nos arredores do acampamento. Cortamos cipós, arbustos, tocos, raízes e removemos paus até a margem do rio, que fica mais ou menos uns 30 metros do rio Xingu. O acampamento ficou com outro aspecto. Almoçamos e depois fomos pescar tucunaré. Pegamos 2 exemplares, que foram comidos fritos. O Tarepá matou também um mutun, grande pássaro, que pesa entre 3 a 4 quilos.

16 de outubro de 2008.
Fizemos café e reiniciamos o trabalho de limpeza em volta do acampamento. Agora dá para ver claramente o rio Xingu. O Tito e o Kokokunti vieram ao acampamento para buscar suprimentos. Eles nos informaram que o Sérgio chegaria hoje no terceiro acampamento de lona azul que fizemos quando abrimos a picada. Este acampamento fica na metade da picada, cerca de 9 Km. Na minha previsão o Sérgio só vai chegar no dia 19. Levará 6 dias e sua marcha está sendo de 3 Km dia. Ele pretende regressar pelo mesmo caminho. São mais 18,460 Km de viagem. Na parte da tarde recebemos do Waiwai. Ele é funcionário da FUNAI. Estava acompanhado de mais 2 índios e um negro – o Duquinha - que é mecânico de tratores da aldeia Piaraçu, que tem como chefe o Bedjai. É conhecido como Duquinha. Almoçou e levou com ele o resto mutun assado. Conversamos sobre a possibilidade de retirarmos o Sérgio pelo rio Jarina, que está a cerca de 2 Km do Centro. É só abrir uma picada até o Jarina e descer de barco até o Xingu, um pouco acima da cachoeira Von Martius e próximo de aldeia do Raoni. Vamos tentar convencê-lo que esta é a melhor opção para o seu retorno. Não é tarefa fácil em se tratando de Sérgio Vahia, com as suas certezas, convicções e extrema força de vontade quando quer fazer alguma coisa. À tardinha fizemos um passeio na outra margem do rio, onde fica uma grande praia. Pegamos um pouco de ovos de tracajá e vimos rastro de anta indicando que ela atravessou o rio em direção ao nosso acampamento na noite anterior. O filho do Tarepá, o Tubai, que tem 11 anos, passou mal à noite. Teve febre e dor de barriga. Demos a ele omeprazol, kaomagma e paracetamol. Nesta noite, matamos uma enorme cobra coral no terreiro do acampamento. Acho que não era venenosa, mas em caso de dúvida metemos o pau nela. Virou comida de jacaré ou piranha. Choveu à noite, mas foi chuva leve, sem vento. Aqui é comum vir chuva com uma ventania arrasadora, denominada de banzeiro. São 22h e 21min e estou escrevendo à luz de uma pequena lamparina por mim confeccionada.

17 de outubro de 2008.
Pulamos da cama cedo, isto é, da rede, fizemos café e saímos para caçar e pescar. O Tarepá matou 3 mutuns e pegamos 14 peixes, sendo 11 tucunarés. No caminho, descemos numa praia e pegamos uma grande quantidade de ovos de tracajá. Regressamos ao acampamento e o Tarepá limpou e assou os peixes e os mutuns. Vão ser levados para a sua aldeia no domingo de manhã quando iremos a São José do Xingu buscar os jornalistas da TVCA. Detalhe importante da nossa pescaria de hoje: o Tubai foi o grande pescador do dia. Pegou 10 dos 14 peixes.

Francis

18 de outubro de 2008.
Hoje é sábado, véspera da gente ir a São José do Xingu. Pela manhã, saímos novamente para caçar e pescar. Desta vez matei um mutun e peguei um enorme tucunaré. Outra vez o Tubai se sagrou campeão, pegou 2 tucunarés e 1 traíra. Depois do almoço caminhei pela picada por 1 hora. O Tubai foi junto comigo. Ele levou arco e flechas e eu a espingarda calibre 20. Fomos até a primeira água da picada. Vimos um bando de jacus e um macaco prego. Na parte da tarde preparamos os barcos para subir até à balsa, onde fica a BR-080. Vamos subir com 2 barcos, sendo 1 rebocado, pois vamos trazer os jornalistas da TVCA, a equipe que está fazendo o filme e provavelmente o Adrian Cowell. Não sabemos ainda se o Raoni virá com a gente ou em barco próprio. Pela minha previsão, acho que o Sérgio, Odone, Tito, Francis e os 6 índios ainda não chegaram ao Centro. Está tudo preparado para a viagem de amanhã. Botamos gasolina nos barcos e acondicionamos nossa bagagem nas caixas com os cadeados. Essa precaução é necessária para evitar qualquer de tipo de ação fora dos padrões que julgamos civilizados.

19 de outubro de 2008.
Domingo. Despertamos às 4 horas da madrugada, fizemos café, colocamos os últimos pertences nas caixas e passamos os cadeados. Para não levarmos as chaves até São José, as enterrei no pé de uma árvore de fácil identificação, a que estava pendurada a lamparina. Coisa de índio. É assim que eles agem. As caixas, como já observamos, são para evitar aquela mão boba que faz parte da cultura dos índios, de um modo geral, e também dos demais povos que deram origem ao povo brasileiro. Aqui essa coisa funciona com freqüência permanente entre todas as etnias. Há, porém, uma significativa diferença nesse tipo de comportamento, os caiapós são mais resolutos. Chegam, olham e tomam uma decisão firme e sem rodeios: estou precisando disso e o assunto está encerrado. São decididos mesmo. Nada de porém, todavia, contudo, no entanto etc. Passamos numa aldeia vizinha e o Tarepá comunicou a eles para tomarem conta do nosso acampamento que era ordem do cacique Bedjai. A coisa lá funciona assim. O chefe mandou, tá falado. Chegamos na balsa às 7h e 50min. Gastamos 2h e 45min. Trouxemos 2 barcos para levar o pessoal do filme e da TV. Os familiares do Tarepá estavam na balsa nos esperando. O Tarepá levou para os familiares mutuns e peixes assados, ovos de tracajás e bananas. Fui para São José do Xingu e o Tarepá foi para a sua aldeia, que fica perto da estrada. Antes passei na aldeia do Bedjai (Piaraçu) para falar com o Raoni que ali se encontrava. Ele estava participando de uma reunião na casa homens. O machismo entre os índios é a regra geral, homens de um lado e mulheres de outro. Essa separação é nítida e eles aceitam isso com naturalidade. Como ia comprar gasolina para os nossos barcos, o Raoni me pediu para comprar 200 litros para ele. Na verdade, o pedido do Raoni é uma ordem. Peguei carona na aldeia Piaraçu na camionete do Geremias. Ao chegar na cidade liguei para Glória, Irani e Reinaldo. Pedi a Glória e a Irani que dessem notícias ao Paulo Castilho, o homem do blog. A equipe da TV chegou no hotel na parte da tarde. Eles vieram de avião próprio. O repórter chama-se Renato, o cinegrafista Valmir e o auxiliar Esmael. O piloto chama-se Ivo. Comprei 375 litros de gasolina, sendo 175 para a expedição e 200 para o Raoni. O Geremias, que é amigo do Raoni e dono do supermercado Xingu, levou a gasolina de volta para a aldeia, a da expedição e a do Raoni. Na parte da tarde conversei a equipe de TV sobre a nossa viagem no dia seguinte. Eles não estavam preparados para enfrentar aquela missão. Não tinham redes, repelentes e roupas adequadas. Ainda bem que me ouviram e compraram alguma coisa. Fui ao posto de gasolina à noite, que também funciona como churrascaria e lanchonete. Seu dono chama-se Nelson. Ele é do Paraná. Durante o dia falei na rádio local sobre a remarcação do Centro. Seu dono e também repórter é o Álvaro, figura simpática e me recebeu bem em sua emissora. Durante essas idas a São José do Xingu fiquei conhecendo o dono de um pequeno bar de nome Dionísio. Ele gosta de plantar árvores de lei em seu sítio. Fiquei conhecendo também o Dr. Luiz, pois fui ao posto de saúde de São José para ele examinar a minha perna esquerda que tinha um espinho de tucum cravado, no que popularmente se chama batata da perna, durante a feitura da picada. Ele me aconselhou a não tentar tirar o espinho com agulha, canivete ou qualquer outro objeto cortante. Recomendou simplesmente compressas de água quente. Funcionou.


20 de outubro de 2008.
Fiquei em São José do Xingu até às 14 horas. Contratamos a camionete do Tico para nos levar até a balsa onde havíamos deixado os nossos barcos no dia anterior. Antes passamos na aldeia Piaraçu para apanhar os galões de gasolina e o Tarepá. O Adrian Cowell chegou em São José do Xingu de avião vindo de Confresa, numa aeronave do prefeito eleito, o Betão. Depois, ele se deslocou com a equipe de filmagem até o campo de pouso da aldeia Piaraçu. Dormiu nessa aldeia para seguir viagem no dia seguinte junto com o Raoni. Com a chegada da equipe do filme na balsa, embarcamos com destino ao acampamento base. Chegamos já era escuro. O Tarepá, que pilotava o barco, deu show de perícia navegando no rio Xingu à noite. Chegamos no nosso pequeno porto sem qualquer desvio. Aliás, o Sérgio havia me falado que os jurunas são exímios canoeiros. Naquele momento estava se formando um grande temporal, depois dissipado. A equipe da TVCA trouxe rede de garimpeiro, que num instante foram armadas. São muito práticas. Comprei 2 delas para meu uso. Jantamos, batemos papo e fomos dormir. Nesta noite dormi no chão para não ter o trabalho de armar a minha rede selva, essa que aparece nas fotografias com o Tito dormindo nela.

21 de outubro de 2008.
Depôs de uma conferência geral na nossa bagagem, iniciamos o deslocamento para o Centro: eu, os jornalistas da TVCA e o Tarepá com a sua inseparável espingarda calibre 20. Levamos 2 marmitas com farofa de carne-seca. Saímos por volta das 9 horas, no horário de verão, e chegamos às 16 horas. Foi uma festa quando chegamos no acampamento do Centro. Lá se encontravam Sérgio, Tito, Odone, Francis, Bedjai, Meuban, Kokokunti, Kiabieti, Bebitoque e seu filho. Logo depois chegaram o Raoni e Adrian Cowell. A equipe de filmagem só chegou à noite. Todos muito cansados. Jantamos e fomos dormir. Detalhe interessante nesse tipo de acampamento, os índios à noite conversam muito em sua língua até tarde e como alguns dormem pouco, lá pelas quatro horas da madrugada a conversa é retomada. Quem não está acostumado com esse comportamento tem dificuldade para dormir.

22 de outubro de 2008.
Levantei-me cedo e fui caçar. Quando cheguei de volta ao acampamento todos já haviam se deslocado para o jatobá onde está localizado o Centro. O novo marco de alumínio foi colocado na face leste do jatobá. O rumo da picada do Xingu ao Centro é leste/oeste. Como em toda solenidade houve discursos do Sérgio e do Raoni, hasteamento da bandeira do Brasil e o Sérgio pode cumprir o que havia prometido: remarcar o Centro na presença de um branco, um índio e um negro (Sérgio, Raoni e o Duquinha). Os oradores disseram que cabe aos mais jovens o papel de conservar aquele lugar para as que futuras gerações saibam que Centro Geográfico do Brasil fica em território indígena. Os índios cantarem uma canção de guerra caiapó. O ato foi filmado e foram tiradas muitas fotos. A equipe da TVCA entrevistou o Sérgio, o Raoni e o Adrian. Essa reportagem será veiculada proximamente pela TV Globo, acho que vai ser no jornal da Globo. Finda a solenidade, regressamos ao acampamento base no mesmo dia, depois de ingerir uma sopa feita pelo Valmir. Como são 18,460Km não foi possível chegar no acampamento base no mesmo dia. Dormimos no Km-10 da picada. Toda a equipe da televisão estava super cansada. Eles levaram muito peso. Só a filmadora pesa 12 Km, o tripé 8 Km e ainda uns 10 Kg de baterias etc. Acho que só de equipamentos eles levaram mais de 30 Km, fora os seus pertences pessoais. Na ida o Tarepá ajudou a carregar, mas na volta não havia nenhum índio para nos ajudar. O Renato já estava com várias bolhas nos pés, o Valmir que na ida foi muito bem com a sua mochila e a filmadora, agora começou a baquear. Em dado momento ele nos informou: estou passando muito mal. A minha pressão caiu. Olhamos para ele e de fato o homem estava branco e soando frio. De repente, começou a vomitar. A partir daí não tivemos outra alternativa, paramos imediatamente no meio da picada. Improvisamos ali o nosso acampamento. Cortei lenha em grande quantidade para fazer uma fogueira. Parecia até fogueira de São João dado o volume lenha. A gente só tinha um facão e nenhuma arma de fogo. Penduramos as redes dos três bem próximas, depois improvisei a minha cama no meio da picada. Plástico de bolinha, sacos de ráfia e sacos de lixo. Até aqui tudo bem, mas eis que o tempo virou e começou a roncar trovoadas e em seguida chuva. Os três tinham capas de chuva, dormiram com elas ao relento. O Renato conversou até a meia-noite. Tempos depois verifiquei que eu estava começando a ficar todo molhado. Com a chuva mais intensa, formou-se uma pequena enxurrada que entrou dentro do saco de lixo. Não tive dúvidas, abri o saco de lixo e coloquei-o sobre a rede do Valmir e fiz nova cama debaixo da rede dele. Só assim pude dormir. Com essa solução, dois problemas foram resolvidos: o Valmir, que passava mal ficou protegido e eu não me molhei mais. Foi um sufoco geral. Ministramos um comprimido de emoprazol ao Valmir. Ao amanhecer no dia seguinte ele estava refeito. Antes da chuva eu e o Esmael, que estava em melhores condições físicas, andamos uns 500 metros na picada para buscar água, local onde o Sérgio tinha feito um acampamento durante o deslocamento para o Centro. A coisa ficou feia naquela noite. Chuva, um doente, outro que não conseguia dormir e que toda hora pedia para o Esmael acender a lanterna. Só dispúnhamos de duas lanternas, uma delas com as pilhas tão fracas que mais parecia um vagalume.


23 de outubro de 2008.
Levantamos ainda estava escuro. Fizemos café com o resto da água que havíamos apanhado na noite anterior e reiniciamos nossa marcha. Ainda havia brasas na fogueira que fizemos para dormir e espantar onças e outros animais. Liguei o GPS e pode verificar que ainda nos faltavam 7 Km para o acampamento base no Xingu. No caminho, ao clarear do dia, encontramos o Duquinha que estava voltando para o Centro. Ele nos informou que torceu um dos pés e que dormiu no primeiro acampamento de lona preta. Errou a direção em 180 graus. Já perto do acampamento encontramos com o Tarepá, Meuban e Kokokunti com marmitas de comida e víveres que iam levando para o Sérgio. Chegamos às 10 horas no acampamento base. Depois de um pequeno descanso, tomamos banho, almoçamos e pegamos o barco até a balsa. Dali a São José do Xingu viajamos em uma camionete da aldeia Piaraçu, que tem como cacique o Bedjai. Seu filho foi o motorista e nos deixou na porta do hotel Elite. No caminho pegamos um grande temporal, mas a viagem foi tranqüila. O Ivo, piloto do avião da TV, estava lá nos esperando. Figura simpática e tranqüila. Fomos almoçar no restaurante da Mariana. À noite repetimos a dose no Mariana. O Raoni estava lá esperando o Adrian, mas acabou jantando comigo e o Ivo e mais dois índios. Combinamos de viajar logo cedo no dia seguinte. O Nego, que é dono do hotel Elite, nos levou até o aeroporto. Já no aeroporto compramos dele alguns enormes pequis que são produzidos naquela região.

24 de outubro de 2008.
Para mim foi o fim da expedição. Viajei até Cuiabá de carona no avião da TVCA junto com o Renato, repórter, o Valmir, câmera, e o Esmael, auxiliar. No comando do avião o tranqüilo piloto Ivo. Saímos às 9 horas de São José do Xingu e chegamos às 12 horas. Eles me levaram até o portão principal do aeroporto, comprei passagem da GOL para as 13 horas com conexão em Brasília. Cheguei ao Rio às 17h e 20min.

25 de outubro de 2008.
Sábado, véspera do segundo turno das eleições, já quase refeito daquela maratona pude assistir o debate pela televisão entre o Gabeira e o Eduardo Paes. No domingo, vou cravar Gabeira 43. À noite fui informado pela Irani que o Sérgio já havia chegado no hotel Elite em São José do Xingu. Saiu do Centro dia 23 e no dia 24 passou pelo acampamento base e chegou ao hotel Elite em São José do Xingu. Foi uma progressão impressionante. Para ir, levou 7 dias. Para voltar, gastou apenas um dia e meio até o acampamento base. Esse é o Sérgio Vahia que pouca gente conhece. Foi e voltou de muleta e tudo, coisa que muitas pessoas duvidavam, inclusive os índios caiapós que tinham um plano de carregá-lo em uma rede. O Sérgio jamais aceitaria tal situação.


IMPRESSÕES GERAIS

Uma palavra final sobre as comunidades indígenas que vivem no Parque Indígena do Xingu. Os índios xinguanos são divididos geograficamente entre os do alto e baixo Xingu. Cada etnia com a sua língua, cultura, tradições etc. Exceção feita aos trumais, que não têm tronco lingüístico conhecido. Todos, porem, vivem da economia de subsistência. Plantam pequenas roças de mandioca, milho, cará, amendoim, banana, pequis, frutas em geral e também arroz. Cito, neste caso, a aldeia do Kiabieti Metuktire (do grupo caiapós mais conhecidos como txucarramães) que colheu este ano 60 sacas de arroz em casca, mas não tem como vendê-las, já que não dispõe de transporte adequado para tal fim. Subir de sua aldeia, no rio Xingu, de canoa por cerca de 45 Km até a balsa na BR-80, não é tarefa fácil e é muito dispendiosa, pois um litro de gasolina naquela região custa atualmente R$3,20. Segundo o Tarepá, que é da etnia juruna, “txucarramãe” (significa homem sem arco).

O Tarepá me contou que os metuktires (coiapós) aprenderam a fazer arco e flecha com um menino juruna que eles roubaram. Além dessa agricultura primitiva, os índios vendem produtos de artesanato, mais acho que essa atividade rende pouco para eles. A ajuda da FUNAI, segundo todos caciques do Xingu, é de pequena monta. Embora haja muitas carências em termos de alimentação, saúde, transporte, comunicação, educação etc, pude observar que, em quase todas as aldeias que paramos, existem aparelhos televisão e rádio de comunicação, exceção feita aos jurunas que não tem rádio. Há outra fonte de renda que é a cobrança de pedágio na travessia da balsa na BR-80, controlada pelos txucarramães, que varia de R$20,00 para motos a R$120,00 para caminhões de três eixos ou dezoito pneus, muito usados no transporte de bois naquela região. Não sei dizer como esses recursos são apropriados, se ficam só para os txucarramães ou são divididos entre todas as etnias. Afinal, fomos participar de uma expedição e não fazer perguntas indiscretas aos índios. Não era esse o nosso objetivo.

Todas as aldeias estão situadas às margens dos rios. Como descemos o Kuluene e depois ingressamos no Xingu, só visitamos algumas aldeias nesse nosso trajeto, mas existem muitas outras aldeias em outros rios que são formadores do Xingu ou seus afluentes. Kuluene, Batovi, Sete de Setembro e Ronuro são considerados formadores, e seus afluentes, sendo os mais destacados Suiá-missu, Auaiá-missu e Tautuari.

Para chegarmos no rio Kuluene passamos por três aldeias kuikuros. O Jacalo é o cacique de uma delas. Ele é filho do cacique Narro que consta como sendo o primeiro índio xinguano a aprender português. Numa dessas aldeias, a do Jairo, o cacique disse ao Sérgio que iria preparar um quarup para ele.

Narro Kuikuro, primeiro xinguano a falar português

segunda-feira, novembro 03, 2008


Finalmente o Centro Geográfico do Brasil foi remarcado.
Compareceram à solenidade três participantes da Expedição de 1958, chefiada pelos Irmãos Vilas Bôas: Sérgio Vahia, idealização e executor da atual Expedição, o cacique Raoni e o cineasta inglês Adrian Cowell. Presentes também Roberto Percinoto, Sérgio Vahia Filho - Tito, Odone Ferrão, os caciques Bedjai e Bebitoke, os índios Tarepá, Meuban, Kokokunti, Kiabieti, o filho do Bebitoke, a equipe que está fazendo o filme (cinco), a equipe de jornalista de TVCA de Cuiabá, que fez a reportagem por solicitação de TV Globo.
Do acampamento base, que fica às margens do Xingu, ao Centro Geográfico são 18 Km de picada que foi feita em 5 dias com o auxílio de um GPS Garmin mapsource -60 CSX.
A picada foi concluída no dia 11 de outubro, um sábado, e estavam presentes: Percinoto, Tito, Kiabieti e Kokokunti.
Depois dessa etapa, o Sérgio iniciou o seu deslocamento até o Centro. Fez esse trajeto com um par de muletas, enfrentando todas as adversidades naturais de uma densa mata: formigas, abelhas africanas em grande quantidade, cipós, espinhos, chuva etc. Faço esse registro para mostrar a fibra de um homem de 80 anos que tem seqüelas de uma embolia em acidente de mergulho em Arraial do Cabo há mais de 30 anos, daí sua dificuldade em caminhar em terreno acidentado.
Abraços
Percinoto